Que atire a primeira pedra quem nunca perdeu um prazo

Comecei a trabalhar como AE na Voxy recentemente e, apesar de trabalhar com um SDR e ter o papel mais de closer, sigo com meta de geração de pipeline. O que significa abordar prospect e desenvolver negócios, principalmente nas contas enterprise. No meu primeiro 1to1 com a minha chefe, mapeei as primeiras 50 contas que ia abordar e disse:

– Meu plano é pelo menos tocar essas contas até o final dessa semana.

Isso já na quarta-feira…

Algumas horas depois da reunião já estava claro que eu não ia conseguir. Ainda estava me acostumando com os softwares que a gente usa na Voxy, muitas das contas tinham dezenas de prospects (alguns desatualizados) e eu ainda não tinha nenhum passo da prospecção automatizado, nenhum modelo de email personalizado.

Mas o que mais me incomodou é que eu já havia situações parecidas com essa dezenas de vezes, seja diretamente no meu trabalho ou no trabalho de outras pessoa. Com essa experiência, devia ser fácil ter uma estimativa mais realista, não?

Não é tão simples assim… Porque existe esse viés cognitivo chamado falácia do planejamento (planning falacy)

O que é a falácia do planejamento?

A falácia do planejamento descreve a tendência de subestimar o tempo que levará para completar uma tarefa, tal qual os custos e riscos associados – mesmo que contradiga nossas experiências passadas.

Adaptado de The Decision Lab

Exemplos desse viés estão por toda a parte, a começar pela grande maioria das obras públicas, passando por projetos de empresas privadas e pelo âmbito pessoal. Sabe aquele trabalho da faculdade que você deixou/deixava pra fazer na última hora porque achava que estava dominado?

Daniel Kahnemann – Nobel de Economia em 2022 escreveu, no Rápido e Devagar (2011), um capítulo só sobre isso. Ele começa contando sobre um projeto e uma equipe que participou. Essa equipe se propôs a criar um currículo de tomada de decisão para as escolas de Israel e, depois de mais ou menos 1 ano, os participantes estimaram, na média, que levaria mais 2 anos pra completar o currículo. Foi então que Kahnemann perguntou para um participante mais experiente, quanto tempo outras equipes que ele conhecia levaram para entregar projetos semelhantes. A resposta foi: 40% das equipes não chegam nem a entregar e, as que entregam, levam de 7 a 10 anos.

Ou seja, se você já estimou errado a duração de um projeto, você está em ótima companhia.

Depois de alguns minutos atônita, a equipe seguiu com o projeto como se nada tivesse acontecido. O projeto currículo demorou mais 7 anos para ser entregue, Kahnemann já nem fazia mais parte da equipe e os órgãos do governo que pediram o projeto já não estavam mais interessados.

Por que isso acontece?

Diversos viéses cognitivos se combinam para criar a falácia do planejamento. O primeiro é o excesso de otimismo, especialmente no que diz respeito às nossas habilidades. Um estudo realizado no Estados Unidos (em inglês) com novos entrantes da universidade perguntaram aos alunos como eles iriam performar em relação aos outros alunos. A resposta média dos alunos foi que eles teriam melhor performance que 84% dos anos. Ou seja, na média 100% dos alunos estão entre os 16% melhores o que é, obviamente, impossível.

Outro viés que age nessa hora é o da ancoragem. Quando a gente desenha o primeiro plano, ficamos enviesados a continuar pensando nos termos desse primeiro plano – prazos, orçamento e por aí vai. Ancoragem é especialmente problemático quando a primeira versão do plano é otimista de maneira irrealista. Mesmo que a gente replaneje, nós ainda ficamos ancorados ao plano inicial o que, muitas vezes, faz com que os ajustes no plano sejam insuficientes. Quer dizer, acabamos fazendo pequenos ajustes apenas, ao invés de um uma mudança maior (mesmo quando necessário).

Outros vieses que entram em ação é a nossa tendências a desconsiderar informações que contradizem nossas visões mais otimistas e a pressão social/organizacional por executar projetos rápidos e sem problemas.

Como evitar

Existem 2 tipos de informação que consideramos quando estamos planejando algo. Informações específica (do seu projeto) e informações abrangentes, de projetos similares que já foram completados no passado. Idealmente, devemos considerar os dois tipos de informação. A falácia do planejamento tende a acontecer quando usamos só informações internas e confiamos em estimativas intuitivas. E, infelizmente, esse é o comportamento que tendemos a desprezar experiências passadas, uma vez que planejar um projeto/tarefa é uma ação direcionada ao futuro.

Ser capaz de considerar experiências passadas e informações externas na estimativa de esforço de um projeto/tarefa, é o que a ciência comportamental chama de The Outside View (visão de fora) e é a primeira técnica para ser mais preciso nas seus próximos planos e estimativas.

Outra ferramenta é a determinação de intenções de implementação detalhadas, ou seja, repassar o plano etapa a etapa, com alto grau de detalhes, nos ajuda a ter projeções mais realistas.

Por fim, estudos também mostram que somos melhores planejamento pequenas tarefas do que grandes projetos. Logo, quebrar projetos grandes em pequenas tarefas também nos ajudam a ser mais precisos.

E você? Já prometeu um negócio e depois não deu conta? Falar sobre também é uma ótima maneira de lembrar da experiência, quando for planejar uma tarefa similar.

Publicado por João Guilherme Braga

Economista, músico, vendedor, consultor, esportista, curioso por tecnologia, educação e política.

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